Minha
irmã médica pede que eu divulgue um concurso de redação proposto pela Sociedade
Brasileira de Geriatria e Gerontologia sobre o tema “Como eu quero envelhecer”.
O concurso se destina a alunos do primeiro e segundo anos do ensino médio, mas
me deixou motivado. Fiquei pensando em como eu gostaria de enfrentar essa prova
que a natureza nos reserva.
Se a velhice é obra da natureza, o sensato é
enfrentá-la de modo natural. Simplesmente deixar que ela venha, dispensando os
artifícios com que tantos procuram negá-la. Nada de plástica, nada de pintar os cabelos, nada de se vestir
como um garoto. Tais recursos não disfarçam a passagem do tempo e acabam dando
aos que deles se servem um aspecto caricato. Revelam desconforto e sofrimento
com a perda da juventude, quando a maior vitória é mesmo aceitá-la.
Dizer que a velhice tem os seus
prazeres é um lugar-comum, mas não há como fugir a ele. O cansaço do corpo
propicia uma abertura do espírito, que se torna mais sensível à beleza. Quero
envelhecer com tempo para ver bons filmes, apreciar boas pinturas, ler alguns
livros que não li. E sobretudo (o mais difícil) fazer grandes viagens. Quero
envelhecer não com riqueza, mas com o dinheiro suficiente para conhecer alguns
dos importantes centros culturais e artísticos do mundo.
Quero envelhecer fazendo o que sempre
tenho feito e desprezando esta palavrinha mortífera – aposentadoria. Envelhecer
no trabalho, que dá sentido à vida. Afinal, somos o que fazemos. Quero
envelhecer fiel aos meus princípios, mesmo errados e às vezes confusos, porque
bons ou maus são eles que me seguram. Mas também quero forças para mudar quando
isso for útil aos que me cercam e não representar uma traição a mim mesmo.
Quero ficar velho com habilidade não
para esperar a morte, mas para me desprender da vida. A morte nada tem de
transcendente; morto, não estarei em lugar nenhum. A vida, sim, transcende. Ela
é o grande mistério, e a perspectiva de perdê-la requer sabedoria. Quero
enfrentar isso com coragem e decência.
Quero
envelhecer com bom humor para encarar o espelho e o olhar das pessoas,
sobretudo aquelas que passam anos sem nos ver e mal disfarçam a surpresa quando
se deparam conosco (parecem não se dar conta de que o espanto é
recíproco). Quero envelhecer sem
rancores, perdoando a quem me feriu e merecendo o perdão daqueles a quem fiz
mal. Com isso eu teria um bom veredicto no julgamento dos homens e poderia,
quem sabe, permanecer algum tempo na sua memória.
Quero envelhecer aprendendo a dizer certas
palavras a quem amei, palavras que ficarem recolhidas por encabulamento ou
falta de jeito. Também quero envelhecer
sem o mau humor nem o azedume tão comuns a boa parte dos velhos, que parecem
desprezar os que em outra quadra do tempo desfrutam a vida (como se essa
oportunidade não lhes tivesse sido ofertada). Quero sobretudo envelhecer com
lucidez, dono do meu corpo e do meu espírito. Se isso for impossível, não faço
questão de ir embora mais cedo.
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